Isenção das bolsas de estudo e pesquisa na legislação do IR e INSS
Uma questão que suscita frequentemente dúvidas difíceis de esclarecer de forma objetiva e clara diz respeito ao tratamento tributário das bolsas de estudo e pesquisa. Isso se deve, também, ao fato de que a denominação dispensada para certas remunerações não é determinante para apuração de sua natureza, sendo necessário analisar a materialidade tributária para concluir se o rendimento é ou não contemplado nas normas de isenção.
Em julho de 2015, a Solução de Consulta Interna Cosit nº 9 tratou de questões referentes à incidência do Imposto de Renda e do INSS sobre bolsas de estudo e pesquisa concedidas por instituições federais de ensino superior, de pesquisa científica e tecnológica e pelas fundações de apoio, nos termos da Lei nº 8.958, de 20 de dezembro de 1994.
A conclusão preliminar apresentada pelo órgão fiscalizador pareceu coerente e aceitável ao afirmar:
“2. As bolsas de ensino, pesquisa e extensão concedidas nos termos da Lei nº 8.958, de 1994, e do Decreto nº 7.423, de 2010, não integram a base de cálculo da contribuição previdenciária desde que se constituam como doação civil, cujos resultados dos projetos não revertam economicamente a benefício do doador e não importem remuneração decorrente de prestação de serviço.”
O mesmo tratamento se pode inferir na legislação do Imposto de Renda, cujo art. 11, I, da IN RFB 1.500/2014, reproduzindo o que dispõe a lei, afirma que são isentas as:
“I – bolsas de estudo e de pesquisa caracterizadas como doação, quando recebidas exclusivamente para proceder a estudos ou pesquisas e desde que os resultados dessas atividades não representem vantagem para o doador, nem importem contraprestação de serviços;”
O que se percebe, entretanto, é que as legislações que tratam do assunto, tanto para fins de incidência do INSS, quanto para tributação do Imposto de Renda, não demonstram claramente o alcance e extensão dos termos restritivos acerca das vantagens ou benefícios em prol do doador. Isto é, o que representaria, nos casos concretos, a doação com encargo, da bolsa de ensino, pesquisa e extensão? Se o beneficiário da bolsa tiver por obrigação prestar serviços durante tempo igual ao da percepção do rendimento, por exemplo, estaria configurada a vantagem para o doador? Por consequência, o rendimento perderia sua condição de isento?
Independentemente de pretender esgotar o tema, já que sua vastidão justificaria um estudo mais detalhado, queremos apenas registrar nossa opinião em torno daquilo que a Receita Federal dispõe no item 3 da ementa da Solução de Consulta aqui examinada. Vejamos seu teor:
“3. No caso concreto, diante dos fatos e do conteúdo probatório encontrado, é que poderá a fiscalização verificar a natureza remuneratória ou não da verba paga pela prestação dos serviços.”
Considerando o que afirmou o FIsco, entendemos que há aqui mais um exemplo de violação ao conceito de tributo constante do art. 3º do Código Tributário Nacional, algo que constatamos em diversas outras normas que tratam do fenômeno tributário no Brasil. Assim afirmamos porque o conceito de tributo a que se refere o CTN faz alusão expressa ao fato de que a prestação de tal natureza deve ser cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. Vejamos:
“Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.“
Ora, se é inerente à atividade de tributação do Estado prescrever em seus diplomas legais os exatos contornos do fato gerador do tributo, a fim de que se estabeleça uma relação com o contribuinte pautada na segurança jurídica, não pode o Fisco avocar para si o direito de avaliar a existência da vantagem ou benefício para o doador nos casos concretos, uma vez que o sujeito passivo da obrigação têm o direito de praticar o ato jurídico com plena ciência do seu enquadramento ou não no tipo legal.
Em outras palavras, temos aqui mais um absurdo exemplo de como as relações jurídico-tributárias em nosso país são baseadas em concepções de um Estado arbitrário, que permite ao preposto fazendário avaliar os fatos objeto da fiscalização de modo subjetivo, influenciado por uma carga de valores e significados que traz consigo.
Felizmente a Constituição Federal assegura como garantia fundamental o direito de o contribuinte recorrer ao Poder Judiciário ante os possíveis abusos praticados pelos auditores fiscais, que acabam por exigir o tributo, por vezes, não por meio de atividade vinculada (prescrita em lei), mas nitidamente discricionária.
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